Escrito por Marcelo de Paula Xavier, M.Sc.*

Quando começou a criar gado Jersey no século passado, Amzi Rankin (pai) não podia imaginar que o rebanho de sua família iria chegar a 1100 vacas e sua propriedade (Cedarcrest Farms) seria reconhecida como uma das melhores fazendas de gado Jersey no mundo.

Cabe destacar que a Cedarcrest Farms foi estabelecida em 1919, originalmente como uma fazenda de produção de algodão. Com o negócio indo mal, em 1933, os Rankins resolveram focar seus esforços na pecuária leiteira e adquiriram uma grande quantidade de animais Jersey de uma fazenda importante do Alabama (estado onde estava localizada a propriedade).

A força da genética desenvolvida no rebanho Cedarcrest ao longo de 30 anos foi comprovada no início da década de 1960, quando os Rankins alcançaram o objetivo de ter 100 vacas classificadas “Excelente”. Naquela época, a fazenda já era bastante renomada no meio Jersey, tendo grande destaque tanto nas pistas de exposição como na comercialização de seus animais. Aliás, em 1960 eles ganharam o prêmio de Melhor Criador no All American Jersey Show, a exposição nacional da raça nos EUA.

Não obstante, a produção de leite deixava um pouco a desejar. “Nossas vacas eram grandes, fortes e com bons úberes. Gostávamos de expor, classificar e fazer acasalamentos visando melhor tipo, mas não...estávamos produzindo leite suficiente para sustentar nossas famílias em expansão e as responsabilidades financeiras crescentes”, declarou Amzi Rankin Junior.

“Durante sua vida, nosso pai nos disse muitas vezes que – se pretendíamos criar gado leiteiro com sucesso por um longo período – primeiro precisávamos ser produtores financeiramente bem-sucedidos. O leite precisa pagar as contas!”, concluiu ele. Ou seja, os Rankins precisavam de mais produção de leite e não de outras qualidades que vinham selecionando. Mas não queriam sacrificar a conformação em troca de produção. Eles decidiram procurar um touro que aumentasse o leite...e mantivesse o tipo! Definitivamente não era uma empreitada fácil.

Em 1963, Joe (irmão de Amzi Jr) voltou do All American muito entusiasmado com a vaca que havia vencido o Milking Derby: BEACON BAS LITTLE LADY. Johnny (outro irmão de Amzi Jr) também a tinha visto. “Na primavera seguinte, Johnny e eu participamos de uma conferência de tipo da AJCC (Associação Americana do Jersey) na Mayfield Farms, no Tennessee. O rebanho era muito impressionante: vacas grandes, alcançando registros de produção excepcionais. Para nós, as filhas da vaca PRUDENT BLONDES LADY eram as mais notáveis”, explica Amzi Jr.

Dois anos mais tarde (1965), um filho da vaca BEACON BAS LITTLE LADY (neta de BLONDES LADY), gerado por MARLU MILESTONE, chegou a Cedarcrest com um pouco mais de 1 ano de idade. Seu nome: MILESTONES GENERATOR  (pedigree abaixo). Ele foi comprado pelos Rankins da Mayfield Farms e advinha de um cruzamento cuidadosamente planejado, em um programa de melhoramento que priorizava a consistência familiar dos animais.

Naquele verão, MILESTONES GENERATOR (foto abaixo) foi usado em quase todo o rebanho Cedarcrest, através da coleta de seu sêmen na própria fazenda. “A cozinha...era o laboratório onde esterilizávamos os equipamentos, diluíamos o sêmen com leite desnatado escaldado e o guardávamos na gaveta inferior da geladeira. Durante várias semanas, tudo o que não havíamos conseguido emprenhar com sêmen congelado (de outros touros) e tudo o que estava pronto para reprodução era coberto pelo GENERATOR. Depois, o touro foi colocado no pasto com um grupo de novilhas, acrescentando-se cada vez mais novilhas conforme ele as emprenhava”, comenta Amzi Jr.

Desde aquele período inicial de uso do GENERATOR, um imenso legado foi estabelecido. Quando suas primeiras filhas começaram a produzir leite, alguns anos depois, ficou evidente que a decisão de comprá-lo havia sido acertada. Sem dúvida, ele foi um dos touros que marcaram, de forma decisiva, a história da Cedarcrest Farms e da própria raça Jersey.

Ele acabou sendo contratado pela ABS e seu sêmen foi disponibilizado para o público em geral, quando se tornou o touro mais popular dos Estados Unidos. No outono de 1976, ele já tinha 6.524 filhas provadas em 907 rebanhos (12.069 registros), com PTAs de +1153 libras de leite, +16 libras de gordura e 99% de Confiabilidade. Foi uma prova extraordinária para um touro criado a partir de algumas das linhagens mais notáveis da raça Jersey, desenvolvidas na Mayfield Farms, depois selecionadas pela família Rankin e aprimoradas na Cedarcrest Farms.

Muitos animais excepcionais surgiram desse impulso genético deixado por GENERATOR no rebanho Cedarcrest. Neste particular, a vaca GENETORS TOPSY merece uma menção muito especial, sendo considerada uma das maiores vacas da raça Jersey. Ela produziu quase 97.000 kg de leite, com uma média de 4,44% de gordura, sendo que aos 8 anos de idade teve uma lactação de 10.555 kg de leite (34,6 kg por dia). 

Além disso, TOPSY foi a primeira Jersey classificada EX-97, ficou em segundo lugar no Concurso de Produção Vitalícia de 1981 nos EUA, teve 4 recordes no Hall da Fama e, ainda, foi a grande campeã do All American Jersey Show em 1973.

A genética que abriu caminho para produção de leite com tipo funcional

MILESTONES GENERATOR representou um ponto de virada para a raça Jersey. Sua influência transcendeu rapidamente os limites da Cedarcrest Farms e se consolidou como um marco definitivo no Jersey moderno. Mais que um reprodutor bem-sucedido, ele redefiniu o equilíbrio ideal entre produção e tipo, provando que era possível ter ambos em alto nível. Suas filhas mostraram com números, úberes e longevidade aquilo que a genética muitas vezes antecipa, mas raramente entrega com tanta consistência.

Falar do melhoramento genético do gado Jersey sem mencionar GENERATOR é ignorar um capítulo fundamental da evolução produtiva da raça. Ele foi uma fonte de genética sólida, funcional e transformadora, abrindo caminho para as gerações seguintes e influenciando pedigrees ao redor do mundo. Seu nome está inscrito não apenas em catálogos e registros, mas na própria essência da vaca Jersey atual.

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*Marcelo de Paula Xavier, formado em Administração de Empresas pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, com Mestrado em Agronegócios pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Foi presidente da Associação de Criadores de Gado Jersey do Brasil por 2 mandatos consecutivos e atualmente é editor do Canal do Leite.