Escrito por Marcelo de Paula Xavier, M.Sc.*

 

Desde os anos 80 até o início desde século, alguns touros Jersey pareciam deixar claro que havia uma congruência (ou sinergia) entre um animal ser “melhorador” de produção e de tipo (conformação). Cito aqui alguns reprodutores fantásticos, que geraram descendentes com alta produção e conformação superior: 

• Highland Magic DUNCAN (nascido em 1980);
• Highland Duncan LESTER (nascido em 1985);
• Hollylane RENAISSANCE (nascido em 1989);
• Sooner CENTURION (nascido em 1991);
• Lester SAMBO (nascido em 1992);
• Schultz Brook HALLAMARK (nascido em 1994);
• Windy Willow Montana JACE (nascido em 1996);
• Forest Glen Avery ACTION (nascido em 1999);
• SC Gold Dust Paramount IATOLA (nascido em 2001); e
• Rapid Bay RESSURECTION (nascido em 2002).

Porém, nos últimos 20-30 anos, parece estar crescendo uma certa incongruência entre “produção de leite” e “pista de julgamento”. É óbvio que animais bem conformados não necessariamente são somente animais de pista. Buscar vacas com tipo funcional deve ser sempre o objetivo de qualquer criador, uma vez que a estrutura corporal, os aprumos e – principalmente – o sistema mamário são o sustentáculo básico para altas produções de leite.

Dito isso, o fato é que a suposta dicotomia “Vaca de Produção vs Vaca de Pista” vem gerando muita polêmica entre criadores pelo mundo afora. Haja vista as discussões acaloradas que, de tempos em tempos, aparecem no facebook, com defensores ferrenhos em ambos os lados desse espectro (usando argumentos válidos os não).

A exposição não deixa de ser um show

Nos Estados Unidos, as vacas de exposição são chamadas de “show cows”, evidenciando um certo caráter de espetáculo, que – em última análise – visa promover os animais de pista e a própria raça em questão. Para os americanos, Dairy Cattle Show (exposição de gado leiteiro) é um evento onde vacas e novilhas são apresentadas e julgadas na pista. A ênfase maior está na beleza funcional: animais bonitos sim, mas principalmente capazes de produzir leite com saúde e longevidade.

Só essa definição já deveria ser suficiente para provar que as coisas precisam andar juntas; ou seja, uma boa vaca de leite tem que ser bem conformada, senão não terá as condições necessárias para manter sua produção. Ademais, o fato dos animais serem avaliados por juízes capacitados e isentos – seguindo os padrões da raça e buscando um equilíbrio geral – deveria, por si só, ser um reforço positivo para os criadores.

É claro que os animais campeões recebem prêmios, reconhecimento e aumentam seu valor comercial, mas os principais objetivos do “show” são:

• Mostrar a qualidade genética dos animais e dos rebanhos;
• Promover a raça e o trabalho dos criadores;
• Valorizar animais para reprodução (principalmente os descendentes de vacas campeãs); e
• Compartilhar conhecimentos e boas práticas entre produtores.

Vacas campeãs que se provam a cada dia

Inúmeros são os casos de vacas Jersey campeãs nas grandes exposições e que apresentam um desempenho espetacular na produção de leite. Para citar apenas alguns exemplos, podemos falar de lendas como Duncan Belle, Huronia Centurion Veronica, Generators Topsy e Vandenberg Amedeo Gorgeous.

O exemplo mais recente, no entanto, é a vaca Stoney Point Joel Bailey (foto), de propriedade da Vierra Dairy Farms (Hilmar, Califórnia). Ela chegou ao topo do mundo "vacum" ao conquistar o prestigioso título de Campeã Suprema da World Dairy Expo 2024, em outubro próximo passado. 

Bailey resume muito bem o que é ser uma vaca de leite completa, tanto em produção como em beleza morfológica:

• Tri Grande Campeã consecutiva da raça Jersey da World Dairy Expo (2023, 2024), sendo que – no ano passado – ela foi também a Campeã Suprema de todas as raças na exposição.
• Classificada EX-97, a pontuação máxima possível para uma vaca de leite (praticamente a perfeição morfológica).
• Fechou 5 lactações completas, sendo que – em sua terceira lactação – ela produziu 9.990 kg de leite em 305 dias (média de 32,8 kg/dia), com 5,1% de gordura e 3,6% de proteína.

Modelo geral e preferências pessoais

Ao longo dos anos, a evolução genética do gado leiteiro foi orientada por metas de produção de leite e por padrões de classificação definidos pelas associações de raças, de modo a moldar vacas consideradas perfeitas.

Em linhas gerais, a vaca Jersey "perfeita" deve produzir bastante leite e sólidos, apresentar boa mobilidade e ter um sistema mamário bem conformado e fortemente aderido ao seu corpo. Além disso, ela precisa ser saudável, reproduzir com eficiência e ser ordenhada com facilidade e rapidez.

Embora cada criador tenha suas preferências pessoais e seus objetivos específicos de criação, é possível afirmar que – de modo geral – é imprescindível que as vacas de leite tenham um balanço entre características de produção e de tipo. Alguns vão buscar animais que estejam mais do lado da produção, para outros, as vacas tem que desfilar com classe e elegância nas grandes pistas de julgamento. 

Mas, em última análise, o desafio e a arte da criação de vacas Jersey "perfeitas" reside justamente em encontrar esse ponto de equilíbrio: produzir animais que sejam eficientes e rentáveis na ordenha, mas que também expressem beleza funcional e longevidade. Afinal, uma vaca verdadeiramente boa e rentável é aquela que alia produção consistente, saúde e fertilidade com uma conformação superior, mesclando força, eficiência e elegância.

 

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*Marcelo de Paula Xavier, formado em Administração de Empresas pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, com Mestrado em Agronegócios pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Foi presidente da Associação de Criadores de Gado Jersey do Brasil por 2 mandatos consecutivos e atualmente é editor do Canal do Leite.