Leite e saúde: Verdades baseadas em ciência e cuidados nutricionais

Leite e saúde: Verdades baseadas em ciência e cuidados nutricionais

24 de dezembro, 2024

Nos últimos anos, uma preocupante tendência tem se evidenciado na população brasileira: a redução do consumo de leite de vaca associada a dúvidas sobre os benefícios para a saúde desse importante alimento.

Essa mudança de comportamento é motivo de atenção, uma vez que o leite é reconhecido por seu valor nutricional, sendo considerado uma fonte de nutrientes que podem auxiliar na composição de uma alimentação balanceada e no crescimento saudável.

Sabemos que muitas informações divergentes circulam sobre o leite, especialmente nas redes sociais, gerando dúvidas para consumidores e até mesmo profissionais da saúde. Dada a relevância do tema nos dias atuais e os aspectos nutricionais envolvidos no consumo do leite de vaca, a Associação Brasileira de Nutrologia (ABRAN) e a Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição (SBAN) concordaram em buscar esclarecimentos sobre o tema, que estão apresentados abaixo, sob a forma de perguntas. As repostas auxiliam no esclarecimento das principais dúvidas existentes sobre o assunto, com base em evidências científicas robustas e atuais, trazendo uma análise crítica dos estudos disponíveis no formato de perguntas e respostas.

Vale destacar que o leite materno deve ser oferecido de forma exclusiva para o bebê até o sexto mês de vida e, de forma complementada, até dois anos ou mais. A disussão informações a seguir referem-se ao consumo de leite para crianças a partir de um ano de idade (na impossibilidade do aleitamento materno), adolescentes, adultos e idosos.

1) Levando em consideração que somos os únicos mamíferos que bebem leite após o desmame, podemos dizer que o leite de vaca é próprio para o consumo humano?

Sim. O leite de vaca não apenas é próprio para o consumo humano, que adquiriu esse hábito devido sua capacidade evolutiva e adaptativa, como também se configura em fonte relevante de proteínas, vitaminas e, especialmente, como o principal alimento-fonte de cálcio e proteína.

Um copo de leite (200 ml) contém, aproximadamente, 244 mg de cálcio e 6,4 g de proteína, o que configura uma oferta maior que 10% da RDA dos dois nutrientes para todas as faixas etárias em uma única porção do alimento (Tabela 1).

Em relação ao cálcio, aliás, não há um alimento que substitua o leite na oferta desse nutriente, considerando não só a quantidade de cálcio presente em sua composição, mas também o percentual de absorção do mineral, o que reflete a quantidade de cálcio que o organismo realmente irá receber. Outros alimentos não apresentam a associação entre boas concentrações de cálcio e alto percentual de absorção que o leite possui (Tabela 2), fazendo com que ele se configure como principal alimento-fonte de cálcio para a nutrição humana.

2) Quais os reais benefícios associados ao consumo do leite de vaca em diferentes fases da vida?

Na alimentação, os lácteos cumprem diversas funções. Os benefícios associados ao seu consumo em diferentes faixas etárias são relacionados à sua alta densidade nutricional, oferta de proteínas, cálcio e componentes com propriedades funcionais, e incluem:

  • Auxílio para correto crescimento e estrutura óssea na infância e adolescência;
  • Diminuição do risco de osteopenia e osteoporose;
  • Redução no risco de doenças crônicas (diabetes, obesidade), cardiovasculares, hipertensão; e
  • Auxílio na prevenção de quadros de sarcopenia na senescência.

Por fim, alguns componentes do leite, como as MFGM (“milk fat globule membrane”) e os peptídeos bioativos apresentam propriedades funcionais que têm sido amplamente estudadas (Quadro 1). Até o momento, as proteínas do leite são consideradas a fonte mais importante de peptídeos bioativos que são, muitas vezes, multifuncionais e mostram duas ou mais diferentes atividades biológicas.

3) Qual a relação entre leite de vaca e inflamação?

Não existem até o momento evidências científicas de que o leite ou seus derivados sejam alimentos “inflamatórios”. Diversos trabalhos indicam que a ingestão de laticínios pode melhorar biomarcadores inflamatórios em adultos e explicam mecanismos de ação que podem estar associados a esse benefício. O consumo de leite estará associado a processos inflamatórios apenas em pessoas diagnosticadas com Alergia à Proteína do Leite de Vaca (APLV) e, neste caso, o consumo de qualquer quantidade de leite, derivados e qualquer produto que contenha leite na sua composição deve ser excluído.

4) O consumo do leite de vaca está associado a maior risco de desenvolvimento de intolerância à lactose? Pacientes diagnosticados com essa condição devem excluir totalmente o leite do seu dia a dia?

Não. O consumo do leite de vaca não está associado a maior risco de desenvolvimento de intolerância à lactose. O que existe é uma relação inversa: quanto maior o consumo de leite menor o risco de desenvolvimento de intolerância à lactose. A exclusão do leite por autopercepção de intolerância que na maioria das vezes não é confirmada por diagnóstico clínico se constitui, sem dúvida, em prejuízo nutricional. Além disso, mesmo para pacientes diagnosticados com intolerância, geralmente 12 g de lactose é tolerado sem sintomas

5) Quais são os tipos de leite de vaca disponíveis?

Os principais tipos de leite disponíveis no mercado podem ser diferenciados pelo teor de gordura presente (integral, semidesnatado e desnatado), adição/exclusão de nutrientes específicos ou tratamento térmico empregado em sua fabricação (pasteurizados e ultrapasteurizados – UHT). Deve-se ressaltar que a indicação de cada tipo de leite deve ser avaliada individualmente.

Resoluções do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) estabelecem normas técnicas para padronização do alimento e critérios de qualidade para a produção, processamento e comercialização do alimento. De acordo com o conteúdo lipídico, o leite é classificado em: ­

  • Leite integral: teor de gordura superior ou igual a 3% de seu conteúdo. ­
  • Leite semidesnatado ou parcialmente desnatado: teor de gordura intermediário, ou seja, de 0,6 a 2,9% do seu conteúdo. ­
  • Leite desnatado: teor de gorduras lácteas totais inferior a 0,5% de seu conteúdo.

De acordo com o processamento empregado, os leites também podem ser divididos em:

  • Leite cru refrigerado: produzido em propriedades rurais, refrigerado e destinado aos estabelecimentos de leite e derivados sob serviço de inspeção oficial. No que diz respeito ao teor de lipídeos, o leite cru refrigerado deve apresentar teor mínimo de 3,0 g de gordura /100 g. ­
  • Leite pasteurizado: leite fluido submetido a um dos processos de pasteurização previstos na legislação vigente, envasado automaticamente em circuito fechado e destinado a consumo humano direto.  ­
  • Leite UHT (Ultra High Temperature): leite homogeneizado que foi submetido, durante 2 a 4 segundos, a uma temperatura entre 130°C e 150°C, mediante um processo térmico de fluxo contínuo, imediatamente resfriado a uma temperatura inferior a 32°C e envasado sob condições assépticas em embalagens estéreis e hermeticamente fechadas.

6) O consumo do leite de vaca UHT é seguro?

Sim. O leite UHT passa por um processo altamente seguro e validado desde meados do século 20. O tratamento térmico seguido de resfriamento e envase em embalagens assépticas (“longa vida”) garantem uma validade mais longa do alimento, sem a necessidade de refrigeração antes do produto ser aberto, além da manutenção da qualidade do leite e de sua segurança microbiológica. Assim, temos um leite microbiológica e nutricionalmente seguro.

7) Quando e para qual público devo orientar o consumo de leite de vaca?

O consumo de leite é importante em todas as fases do curso da vida, na infância, na adolescência, na gestação e para adultos e idosos, em função da sua qualidade nutricional. Leite e laticínios são recomendados em diferentes diretrizes internacionais e guias alimentares nacionais e internacionais, e a inclusão do alimento na rotina alimentar dos brasileiros, quando não houver contraindicação, deve ser encorajada pelos profissionais de saúde.

Conclusão

  • O leite é um alimento que sempre foi consumido pelo ser humano, que se adaptou do ponto de vista evolutivo, para utilizá-lo como fonte nutricional relevante; ­
  • Lácteos são fonte de diversos nutrientes de perfil estrutural, metabólico e funcional. Especialmente o cálcio tem no leite sua principal fonte, o que torna esse alimento fundamental para prevenção de doenças ósseas e dentárias; ­
  • O consumo de leite está associado a diversos benefícios à saúde, incluindo efeitos favoráveis na prevenção de doenças crônicas, cardiovasculares, osteoporose, desempenho cognitivo, dentre outros; ­
  • O leite pode eventualmente apresentar perfil “inflamatório” em pacientes portadores de APLV. Em pessoas não alérgicas, a ingestão de laticínios pode melhorar biomarcadores inflamatórios em adultos;
  • Pacientes intolerantes à lactose, dependendo do grau de acometimento (leve, moderado ou grave) podem consumir leite dentro da quantidade que se sentir confortável. Adicionalmente, podem optar por leites sem lactose ou usarem a enzima lactase via oral no momento da ingestão de leite;
  • O leite é considerado um alimento seguro, estando presente em praticamente todos os guias alimentares. Obviamente, intolerâncias e alergias individuais existem e devem ser levadas em conta;
  • O método UHT (Ultra High Temperature) é regulamentado e aprovado por órgãos de saúde internacionais e nacionais e garante a qualidade microbiológica do leite, sem alterar as características nutricionais. Associado à conservação em embalagem assépticas, permite maior tempo de prateleira e ainda mais segurança microbiológica;
  • O leite materno deve ser oferecido de forma exclusiva para o bebê até o sexto mês de vida e, de forma complementada, até dois anos ou mais;
  • O consumo de leite de vaca é indicado para crianças a partir de um ano de idade e ao longo de toda a vida.

É importante lembrar que as orientações dietéticas devem ser sempre personalizadas, levando em consideração as necessidades nutricionais individuais e as condições de saúde, o que reforça a importância do profissional de saúde para realização de uma intervenção adequada.

Para informações mais detalhadas, faça o download do "Consenso da Associação Brasileira de Nutrologia e da Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição sobre o consumo de leite de vaca pelo ser humano":

 

Fonte: FairFood

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