Criação de bezerros beef-on-dairy já é realidade no Brasil e ganha respaldo científico

Criação de bezerros beef-on-dairy já é realidade no Brasil e ganha respaldo científico

15 de dezembro, 2025

O que é beef-on-dairy? 

A estratégia beef-on-dairy, que consiste em inseminar vacas leiteiras com sêmen de raças de corte, vem ganhando força no Brasil e no mundo. 

É uma forma de valorizar os bezerros oriundos desses cruzamentos, gerar renda adicional para as fazendas e reduzir o número de machos leiteiros – historicamente considerados um dos grandes desafios do setor. Esses animais são destinados à produção de carne e vêm conquistando reconhecimento da indústria, que valoriza a qualidade do produto obtido, especialmente em um momento de mercado aquecido. 

Esse movimento é favorecido pelo avanço reprodutivo das propriedades, que hoje alcançam boas taxas de reposição de novilhas, contam com vacas mais produtivas e utilizam com frequência o sêmen sexado, atingindo facilmente o número necessário de fêmeas para reposição do rebanho. Dessa forma, reduz-se a pressão por produzir mais fêmeas e abre-se espaço para a adoção de cruzamentos com raças de corte, sobretudo em vacas de menor valor genético ou com capacidade reprodutiva comprometida. 

Nos últimos anos, cruzamentos como Angus × Holandês, Hereford × Holandês, Angus × Jersey e Wagyu × Jersey deixaram de ser exceção e passaram a integrar a rotina de muitas propriedades no Canadá, Estados Unidos e mais recentemente, no Brasil. Apesar disso, permanece a dúvida: as características de parto e o peso ao nascer são semelhantes às de bezerros Holandeses? Qual é o ganho de peso desses bezerros no bezerreiro? Eles adoecem mais ou menos que os bezerros Holandeses puros? Apresentam diferenças de comportamento? 

A literatura científica ainda oferece poucas comparações diretas entre beef-on-dairy e Holandeses criados sob as mesmas condições de manejo, e preencher essa lacuna é fundamental para orientar decisões técnicas e econômicas no campo.

O que o estudo encontrou? 

Recentemente, a revista internacional Dairy (MDPI) publicou um estudo conduzido por pesquisadores brasileiros do grupo EthoLab (PUCPR), realizado durante o mestrado de Michail Moroz sob orientação do professor Ruan Darós. A pesquisa analisou o desempenho de bezerros beef-on-dairy (Angus × Holandês) em comparação a animais holandeses puros durante o período pré-desmame, trazendo dados inéditos sobre saúde, crescimento e manejo desses animais.  

Foram avaliados 379 animais (290 Holandeses e 89 Angus × Holandês), em uma fazenda comercial de alta produção no Paraná. Todos receberam manejo padronizado, com colostragem adequada, diagnóstico e tratamento de doenças, fornecimento de 4 até 8 litros de dieta líquida por dia, dependendo da idade, sendo desmamados aos 78 dias de vida.

Principais achados 

  • Peso ao nascimento: bezerros beef-on-dairy nasceram mais pesados do que bezerros holandeses; 
  • Parto: os bezerros beef-on-dairy machos exigiram maior assistência ao parto, em função do maior peso; 
  • Saúde: mesmo com colostragem semelhante, a diarreia foi quase três vezes mais frequente em Holandeses, enquanto a ocorrência de doença respiratória bovina (DRB) foi semelhante entre os grupos; 
  • Desempenho: os bezerros beef-on-dairy apresentaram ganho de peso superior (1,43 kg/dia) em relação aos Holandeses (1,29 kg/dia), chegando ao desmame mais pesados.  

O que os resultados mostram? 

Sob as mesmas condições de manejo, os bezerros beef-on-dairy: 

  • Ganham mais peso que os Holandeses puros; 
  • Adoecem menos de diarreia, uma das principais causas de mortalidade no aleitamento; 
  • Mantêm índices adequados de transferência de imunidade e bom desenvolvimento quando bem manejados. 

Esses achados reforçam o potencial da estratégia beef-on-dairy para gerar animais de boa performance e maior valor de mercado, desde que respeitados aspectos cruciais de cuidado e manejo.

Se liga!  Na fazenda estudada, todos os animais recebiam 8 litros de leite por dia, em mamadeira, e eram mantidos em ambientes limpos, bem arejados, com equipe treinada e supervisão veterinária.  

Implicações para a cadeia leiteira 

Ao demonstrar melhor desempenho e maior robustez frente a doenças entéricas no pré-desmame, o estudo evidencia que o beef-on-dairy pode contribuir para: 

  • Sustentabilidade econômica, ao gerar nova fonte de receita para a propriedade leiteira, com bezerros valorizados para a produção de carne;
  • Bem-estar animal, ao reduzir o nascimento de machos leiteiros descartados, desde que os beef-on-dairy recebam manejo adequado em todas as fases. 

A criação com bons padrões de manejo gera animais com bom desempenho zootécnico logo no início da vida. 

O manejo no pré-desmame define o destino produtivo e econômico do animal. A bezerra de hoje será a vaca de amanhã, da mesma forma, um bezerro beef-on-dairy bem criado pode gerar uma carne de qualidade no futuro.

Recomendações 

  • Prover corretos cuidados aos beef-on-dairy, assim como preconizado para bezerras de leite: garantir bom manejo de colostro (volume, qualidade e tempo de fornecimento adequados), cura de umbigo, protocolos de vacinação e nutrição adequada desde o início. A estratégia só se traduz em vantagem quando acompanhada por manejo correto; 
  • Atentar-se ao parto: os machos beef-on-dairy podem exigir mais assistência. Algumas empresas de genética já oferecem sêmen direcionado para o beef-on-dairy, justamente para minimizar esse desafio; 
  • Pensar no longo prazo: investir em saúde e desempenho desde cedo transforma os beef-on-dairy em animais competitivos para a cadeia da carne, promovendo produção de carne de qualidade e rendimento.

Os pesquisadores adiantam que um novo estudo, já concluído e em fase de submissão a revistas científicas, mostrou que bezerros beef-on-dairy apresentaram maior frequência de comportamentos alimentares em comparação aos holandeses.

Considerações finais 

beef-on-dairy é uma estratégia promissora, mas não pode ser encarado como receita pronta. Cada fazenda deve avaliar sua logística, estrutura e capacidade de manejo antes de adotá-lo. Caso contrário, o risco é apenas trocar de problema: em vez de bezerros leiteiros desvalorizados, teremos bezerros beef-on-dairy igualmente mal manejados. 

É como tentar pregar um parafuso com um martelo: a ferramenta é boa e a ideia faz sentido, mas, se usada de forma errada, a solução pode virar um novo problema. 

Fatores como logística, desde a decisão da fazenda em criar os bezerros ou vendê-los logo nos primeiros dias, até a definição sobre se a recria e a engorda serão realizadas em unidades especializadas ou na própria propriedade leiteira, ainda precisam ser amplamente discutidos. Além disso, os custos de cada fase devem ser cuidadosamente avaliados para que a estratégia beef-on-dairy seja realmente viável e rentável. 

Alguns exemplos positivos já podem ser observados no Brasil. Cooperativas como a Frísia, Capal, em parceria com a CooperAliança, têm incentivado seus associados a adotar essa prática e os resultados têm sido promissores, com maior valorização dos animais e ganhos para toda a cadeia produtiva. 

Dar ao bezerro beef-on-dairy os cuidados que também são priorizados para bezerras de leite é investir em bem-estar e transformar um animal que não tinha destino em receita para a propriedade.

 

Fonte: Revista Leite Integral

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